Bibliofilia: Amor por livros e por ler. O Bibliófilo ama ler e sente devoção pelos livros, colecciona-os e admira-os.

30/01/2013

Estante à Quarta (30)




(Estantes feitas à medida, aqui)

29/01/2013

Um ano de Kindle

Fico sempre surpreendida como as coisas mudam. 

Há uns dias falava com a Célia acerca das nossas primeiras impressões quando foi lançado o primeiro Kindle da Amazon, no longínquo ano de 2007. Já com tecnologia e-ink, este leitor parecia bastante rudimentar e pouco promissor, especialmente para uma mente fechada como a minha. Nessa altura eu era ainda uma fervorosa defensora dos "verdadeiros livros", que nunca seriam ultrapassados pelas versões digitais, em última instância porque eu própria jamais renunciaria aos livros físicos. Jamais! Na ponta da língua tinha o manifesto anti-ebooks:


Porque os equipamentos não são funcionais! 

Porque ler num ecrã é penoso e cansativo!

Porque a bateria do leitor pode acabar a qualquer momento!

Porque gosto de sentir o peso e textura dos livros!

Porque ando sempre com um livro comigo!

Porque nunca vai ser tão fácil aceder a um ebook como ir à estante buscar um livro!

Nunca vai ser a mesma coisa! 

E, alas, e-readers não têm cheiro a livro! Pim!



Em 2010 era lançado o Kindle Keyboard, ou Kindle 3, um equipamento de terceira geração, com tecnologia melhorada. Foi este modelo de Kindle que me interessou pela primeira vez. Sempre convicta na minha fé anti-ebook, permaneci desdenhosa e pouco impressionada (mas ainda assim algo impressionada, contra a minha vontade). Com mais opiniões disponíveis na web, continuava em esforço para resistir à conversão. Quando as opiniões começaram a vir de pessoas próximas que acabaram por adquirir um, a situação tornou-se subitamente séria. 


Quanto mais lia sobre o assunto, mais irritada ficava com a falta de argumentos negativos para poder continuar a odiar ebooks. 

Mas como assim, não cansa os olhos? 

Como assim, o ecrã não reflecte a luz? 

Como assim, não tem comparação com leitura num computador?

Definam "lê-se bem quase como em papel".


Até que, não sei exactamente quando, cedi à tentação e deixei-me seduzir pelo Kindle. Lia as palavras racionais das e-evangelistas Célia e da WhiteLady3, espalhando a e-palavra, e cada dia me convertia mais. A Amazon, tal como revolucionou o negócio de venda de livros, fez o mesmo com a indústria dos e-books. Com uma tecnologia inovadora e uma oferta de livros satisfatória, criou um produto que finalmente vai de encontro às necessidades e exigências do leitor. O e-reader deixava de ser apenas mais um gadget sofisticado, e passava a ser uma verdadeira ferramenta de leitura, para o verdadeiro leitor. 

Em Março de 2011, já convertida, adicionava esta imagem ao blog, simultaneamente uma declaração de rendição e uma sugestão para a minha entidade paternal, que eu sabia que frequentava este espaço. Não teve o efeito pretendido. 



Durante todo o Verão as discussões sobre como o kindle é um amigo do leitor e dos livros estiveram ao rubro, com o anúncio de um novo modelo a ser apresentado perto do fim do ano. Em Setembro foi lançado o Kindle 4. O modelo "low cost" do Kindle, mais pequeno, mais leve, mais barato e com menos funcionalidades mas focado na sua função primária: leitura.


Veio o Halloween, e com ele um piquenique onde a Sofia mostrou o seu novíssimo Kindle 4. Foi amor à primeira vista. Tendo ouvido e lido tudo o que havia na net para ouvir e ler sobre o Kindle, nunca tinha visto um ao vivo. Fiquei maravilhada com a qualidade de um ecrã que "parece mesmo papel" e com o comportamento bizarro da e-ink no ecrã, imitando tinta real. Tentei metê-lo na minha carteira à socapa (fracassei) e desde esse dia o meu twitter feed nunca mais foi o mesmo. 

A hashtag #euqueroumkindle foi a mais popular durante semanas, e eu, qual arauto do Kindle, não me coibia de explicar a quem me quisesse (e não quisesse) ouvir porque é que o Kindle é um objecto de leitura fantástico e de enumerar todas as suas vantagens e desvantagens. Com a mudança de emprego em vista, fazia planos para um primeiro ordenado amazónico.

Mas, conforme referi no primeiro post deste ano, um grupo de pessoas maravilhosas lembrou-se de acabar com as minhas lamúrias diárias no twitter, e juntou-se para me oferecer o tão desejado Kindle 4. Recebi-o precisamente há um ano, um dos melhores presentes que alguma vez recebi, da forma mais improvável e prestes a levar muita gente à loucura, com as minhas recusas em encontrar-me pessoalmente com o meu presente (eu a pensar que estavam a tramar uma qualquer infame manifestação de despedida. Oh meu deus, se eu soubesse! Ah, a ignorância!). O vídeo em que desembrulho o meu presente, que todos os amigos assistiram de vários pontos do país (e no Rio de Janeiro!) já não está disponível online, mas para mim permanece bem presente esse momento na minha memória. Muito mais do que pelo objecto em si, um gesto mais que tocante, numa altura em que tive de deixar todos os meus livros para trás. Acho que nunca vou agradecer o suficiente. 

Já foram publicadas mais do que suficientes opiniões e reviews do Kindle, e por isso não vou fazer uma. A minha opinião relativamente a e-books saiu reforçada com a minha experiência de um ano de Kindle; com o melhor da tecnologia ao meu dispor posso usufruir das vantagens e ao mesmo tempo continuar a adorar livros. Porque esse é o pior erro de quem segue as linhas do meu manifesto anti-ebooks: ler ebooks não significa deixar de ler livros físicos. 

Num ano de kindle li 15 livros completos, e em 4 alternei entre as edições física e digital. Não é um número gigante, mas tendo em conta que li 32 livros no ano passado, é uma proporção interessante.

O primeiro livro que li no meu kindle foi The Help, de Kathryn Stockett, que acabou de se revelar um dos favoritos do ano.

Alguém disse que só as pessoas estúpidas nunca mudam de opinião. Eu mudei ao longo do tempo e o meu manifesto anti-ebooks soa-me agora obsoleto. Ter um kindle não fez de mim menos bibliófila porque...

Os equipamentos não são funcionais! 
Os equipamentos são cada vez mais práticos e funcionais. O Kindle revolucionou o mercado, mas há agora várias marcas de equipamentos tão bons ou melhores, a preços cada vez mais acessíveis.

Ler num ecrã é penoso e cansativo!
A tecnologia de electronic paper é fantástica e a leitura é bastante semelhante à leitura em papel. Não só não cansa os olhos como até leio mais rapidamente no kindle.
A bateria do leitor pode acabar a qualquer momento!
A bateria dura semanas mesmo com utilização diária, mais vezes me aconteceu acabar um livro em plena viagem e não ter mais nada para ler do que ficar sem bateria no kindle (nunca aconteceu).

Gosto de sentir o peso e textura dos livros!
Sim, gosto de sentir o peso e textura dos livros, mas como é útil ler um livro de 800 páginas sem lesionar os pulsos. Como é fantástico andar em transportes públicos sem carregar 1kg literário extra.

Ando sempre com um livro comigo!
Continuo a andar sempre com um livro comigo. Quando não tenho um livro físico, tenho centenas no kindle. Posso acabar um livro e iniciar outro imediatamente. Cansada, posso suspender uma leitura mais pesada por um livro que exija menos atenção. As possibilidades são tantas como a capacidade em disco permite (permite centenas).

Nunca vai ser tão fácil aceder a um ebook como ir à estante buscar um livro!
Muito poucos foram os livros que tive dificuldade em adquirir para o kindle. Porque assim que penso em ler um, está à distância de um clique. 

Nunca vai ser a mesma coisa.
Não vai. Ler um ebook não é o mesmo que ler um livro físico. Vários livros tenho em ambas as edições, e vou continuar a adquirir livros e a suspirar com estantes.

Se o livro digital vai destruir o livro físico, creio que não será no meu tempo. Posso continuar a ler no meu adorado, querido, lindo kindle sem remorsos.  (mas eu também achava que a tecnologias dos e-readers ainda tardaria muitos anos até estar ao nível das exigências dos leitores...)

A minha maior dificuldade é perceber como é que sobrevivi tanto tempo sem ele. 


Alas, e-readers não têm cheiro a livros. Por isso é que continuo a snifar livros.

25/01/2013

Diário de Anne Frank - Livro interactivo




O Diário de Anne Frank foi um dos livros que mais me marcou. Li-o na minha adolescência e ficou sempre como um dos meus favoritos, apesar de nunca ter sentido vontade de o reler. 
Celebra-se agora o 65º aniversário da primeira publicação d'O Diário de Anne Frank, e a Penguin lançou uma aplicação, para Apple e Nook, para trazer o livro à vida e explorá-lo de forma interactiva.



Além do livro completo em texto, podem ouvir-se partes narradas pela Helena Bonham Carter. A versão digital do livro contém diversas ligações para conteúdos extra, tais como clips áudio e vídeo, incluindo um comentário de Miep Gies, uma das pessoas que prestou auxílio a Anne Frank e a sua família. Podemos ver também uma edição facsimile do diário original traduzido para inglês, fotos da família antes da guerra, mapas originais feitos à mão, reproduções e esquemas do quarto e casa onde Anne Frank vivia escondida, etc. Adorei esta iniciativa, que considero uma excelente forma de conhecer ou redescobrir esta obra marcante e aprender um pouco mais sobre esta vertente da Segunda Guerra Mundial. Um pequeno vídeo mostra as potencialidades da aplicação, disponível por £6,99:




24/01/2013

Shadowfell

Autor: Juliet Marillier

Nº de páginas: 410

Editora: Knopf Books (Setembro 2012)



Sinopse: Sixteen-year-old Neryn is alone in the land of Alban, where the oppressive king has ordered anyone with magical strengths captured and brought before him. Eager to hide her own canny skill—a uniquely powerful ability to communicate with the fairy-like Good Folk—Neryn sets out for the legendary Shadowfell, a home and training ground for a secret rebel group determined to overthrow the evil King Keldec. During her dangerous journey, she receives aid from the Good Folk, who tell her she must pass a series of tests in order to recognize her full potential. She also finds help from a handsome young man, Flint, who rescues her from certain death—but whose motives in doing so remain unclear. Neryn struggles to trust her only allies. They both hint that she alone may be the key to Alban’s release from Keldec’s rule.
Homeless, unsure of who to trust, and trapped in an empire determined to crush her, Neryn must make it to Shadowfell not only to save herself, but to save Alban.



Opinião: Não é novidade nenhuma que a Juliet Marillier é uma das minhas autoras favoritas. Apenas divide o pódio com a Anne Bishop, mas a Juliet é a minha autora favorita mais antiga e à qual sou mais fiel (se bem que tem um livro que já foi publicado em português há séculos, que comprei e que ainda não li; não falemos disso, não suporto a vergonha). É-me portanto difícil ser totalmente imparcial ao emitir opinião acerca desta autora. Mas mesmo com toda a minha devoção, é com pena que vejo as pressões editoriais obrigarem-na a apostar em romances Young Adult, um género que não é o meu favorito, nem o seu forte. 

Apesar desta mágoa pessoal, continuo a ler os seus livros Young Adult e a achar que são os melhores YA que alguma vez li. Porque a Juliet é assim: uma contadora de histórias nata, que cria personagens com as quais nos ligamos imediatamente, constrói um universo envolvente e um cenário cativante seja o que for que esteja a escrever, uma mestre com as palavras. 

Não foi por isso uma surpresa quando as primeiras páginas deste livro me fizeram refém, mais uma vez. Tal como comentei algures na altura, ler Juliet Marillier é como regressar a casa. 

Shadowfell é um livro YA, o primeiro de uma trilogia cuja protagonista, Neryn, é uma jovem em dificuldades. Após a perda da família, Neryn vive constantemente em fuga devido à perseguição levada a cabo pelo tirano Rei Keldec a todas as pessoas com dons mágicos. Numa altura em que todo o reino de Alban vive com medo, e ninguém ousa abrir a porta a uma rapariga "especial", Neryn viaja sozinha em direcção ao mítico local Shadowfell. A própria jovem não sabe o que encontrar nesse local, mas memórias desse nome no seio da família e um profundo instinto que a incentiva a continuar dão-lhe força para seguir viagem. Os elementos da Natureza e a influência humana prometem no entanto dificultar-lhe o progresso, mesmo com a ajuda das criaturas mágicas Good Folk, e do misterioso Flint. 

Neryn é uma personagem com a qual senti empatia desde o início, e a personagem do Flint, misteriosa e não totalmente confiável, constitui o cativante protagonista masculino. Quanto ao cenário e às personagens, a fórmula não é novidade alguma, pelo contrário, é típica da autora. Para alguns leitores seria o suficiente para  não ler mais do que os primeiros capítulos e pousar o livro, mas eu fui cativada desde o primeiro momento. Fui recompensada ao longo do livro pelas surpresas no enredo e pelo crescimento das personagens. A história ganha ritmo desde o início e nunca perde momentum, culminando num final surpreendente e, principalmente, abrupto e em aberto. Quando virei a página e vi que não havia mais capítulos fiquei chateada com a Juliet por me deixar assim pendurada, sedenta de mais história (já a perdoei). Até pensei que o livro era minúsculo, até ter confirmado que o número de páginas é "aceitável", assumindo portanto que a leitura é que terá sido demasiado rápida. 

Este não é um livro à altura da literatura para adultos que eu tanto adoro da autora. A história sabe a pouco e os fãs mais exigentes podem não ficar satisfeitos, mas é sem dúvida uma boa maneira de voltar a casa, e eu adorei-o mesmo assim. 


O melhor: A escrita, sempre a escrita da Juliet Marillier.

O pior: O final em aberto

4/5 - Gostei bastante

23/01/2013

Estante à Quarta (29)

Peças de joalharia bibliófila, da Janda JewelryAs minhas peças favoritas são as pulseiras, tão giras!







16/01/2013

Bibliofilia pelo mundo (IV) - Book Mountain


Book Mountain

A empresa holandesa MVRDV desenvolveu recentemente o projecto Book Mountain, que chegou a ser distinguido com o prémio de segunda melhor biblioteca da Holanda em 2012, além de uma série de prémios nacionais e internacionais das áreas de arquitectura, design e sustentabilidade.

Com este projecto - Book Mountain (Montanha de Livros), Spijkenisse, nos arredores de Roterdão, ganhou não apenas uma fantástica nova biblioteca pública como também infraestruturas comunitárias construídas na própria e em redor da biblioteca - espaços comerciais, auditório, espaços de desportos, escritórios, um centro de educação ambiental, etc.

Mas para o bibliófilo, o mais impressionante de tudo é a biblioteca em si. Uma montanha de estantes repletas de livros, contidas numa estrutura piramidal de vidro transparente. A visão nocturna da biblioteca é particularmente encantadora. 

(Fotos maiores ao clicar nas miniaturas. Originais aqui.)






Ao expor assim o conteúdo da biblioteca, transformando o edifício num "farol" de conhecimento e informação ao alcance de todos, sem barreiras físicas, os arquitectos da obra pretenderam demonstrar como numa era digital de compra e venda de livros online, ainda há espaço para as bibliotecas físicas inseridas na comunidade. 


O edifício está desenhado de forma a permitir que os seus utilizadores, a comunidade, aproveitem ao máximo a biblioteca e o que ela tem para oferecer. 
O conceito de "montanha" foi atingido localizando a maioria dos espaços comerciais e espaços fechados no interior e pisos inferiores do edifício deixando as áreas de topo e periferia abertas à luz natural. Rotas de circulação, escadas e espaços de relaxe e leitura, e claro, as próprias estantes expondo a colecção da biblioteca, oferecem a ideia visual das encostas da montanha. Uma rota espiral à medida que se "sobe" a montanha permite seguir a ordem alfabética da organização dos livros.  



Como não podia deixar de ser quando se reúnem dois conceitos como "arquitectura moderna" e "comunidade holandesa", todo este projecto é bio sustentável. Ventilação e iluminação naturais, estantes feitas de materiais reciclados a partir de resíduos urbanos, utilização de plantas naturais no controlo de temperatura e aproveitamento do calor terrestre são apenas alguns dos sofisticados detalhes incluídos neste projecto. 


Com tudo isto, e tendo em conta que esta biblioteca apenas ganhou o segundo prémio de melhor biblioteca da Holanda, resta-me agendar algum tempo no futuro para investigar a que ficou em primeiro lugar.



Outras Bibliofilias pelo Mundo: 

14/01/2013

Life of Pi


Autor: Yann Martel

Nº páginas: 356

Editora: Seal Books

Primeira edição: 2001


Sinopse (da edição portuguesa): Publicado em Portugal pela Difel em 2003, A Vida de Pi valeu a Yann Martel o Man Booker Prize de 2002, entre outros prémios, e figurou como bestseller do New York Times durante mais de um ano. Sete anos após a primeira edição, a obra ocupa a 74ª posição no top de ficção da Amazon americana e o 99º lugar na tabela de vendas da amazon inglesa. A Vida de Pi encontra-se publicada em mais de 40 países.

Quando Pi tem dezasseis anos, a família decide emigrar para a América do Norte num navio cargueiro juntamente com os habitantes do zoo. Porém, o navio afunda-se logo nos primeiros dias de viagem. Pi vê-se na imensidão do Pacífico a bordo de um salva-vidas acompanhado de uma hiena, um orangotango, uma zebra ferida e um tigre de Bengala. Em breve restarão apenas Pi e o tigre.



Opinião: Comprei a edição portuguesa deste livro há uns 3 anos, ou mais. Não consigo encontrar a razão pela qual sempre fui adiando a sua leitura ao longo do tempo, mas este é um daqueles casos em que senti um profundo arrependimento por não o ter lido há mais tempo. A verdade é que tenho de agradecer a Hollywood por ter decidido fazer uma adaptação do livro, uma vez que foi esse o empurrão que precisava para pegar neste livro. 

Pi Patel é um menino indiano que passa a infância e parte da adolescência em convivência com os animais selvagens que vivem em cativeiro no Zoo de Pondicherry, na Índia. Até ao dia em que os pais decidem emigrar para o Canadá, levando consigo num cargueiro a maioria dos animais para realojar em zoológicos do norte da América. O cargueiro acaba por naufragar ainda na fase inicial da viagem, reunindo-se num bote salva-vidas os únicos sobreviventes da tragédia: uma zebra, um orangotango, uma hiena, um tigre de Bengala e Pi.

Filho de pais metódicos e pouco religiosos, Pi é um menino curioso e estudioso, além de profundamente sensível ao comportamento animal e à natureza humana. Pi chega aos seus 16 anos professando não só a religião hindu, comum entre o seu povo e na sua família, como também o cristianismo e o Islão, sem considerar que nenhuma das religiões contraria as outras.

O facto de uma pessoa tão profundamente religiosa escolher para si próprio (o seu nome verdadeiro é Piscine) o nome de um símbolo matemático é um detalhe delicioso desta personagem fascinante e invulgar. 

Na verdade, considero que todo este livro me cativou principalmente pela personagem de Pi. Um miúdo brilhante, inteligente e culto, sempre desejoso de aprender e incrivelmente corajoso, além de espirituoso. 

Além disso, é um livro incrivelmente bem escrito.A voz do autor é deslumbrante, cativante desde o primeiro minuto, mesmo nas partes mais aborrecidas e descritivas do livro. Ao longo da obra, e não deixando de me surpreender durante a narrativa, Yann Martel fez-me soltar gargalhadas ao longo do livro, tão frequentemente como as suas detalhadas descrições do quotidiano num bote salva-vidas e do sofrimento dos seus habitantes me fizeram ranger os dentes e pensar "por favor, já chega, é demais". Quase consegui sentir o calor sufocante, o sal a corroer-me a pele e a tensão territorial lidando com o tigre, mas logo a seguir ria-me com uma qualquer saída espirituosa do querido e corajoso Pi. 

Não há muito mais formas de descrever esta história além de dos clichés "enorme luta pela sobrevivência", "belíssima metáfora espiritual", "história de coragem e resistência" e "busca espiritual e religiosa". Mas há muito mais que se pode dizer sobre este livro. 

Yann Martel agarrou-me ao destino das suas personagens e deliciou-me com a sua escrita fantástica, ao mesmo tempo bela, simples e desarmante, com passagens inspiradoras, e por vezes até cruas e aterrorizantes. Como se não fosse suficiente, quando achava que já tinha esta história definida na minha cabeça e sabia para onde ela me levava, fui arrebatada pelo final, quando este livro me retirou o tapete de debaixo dos pés. E isso foi o melhor de tudo. Como leitora, que mais poderia esperar de um livro?

O melhor: A escrita, Pi e Richard Parker

O pior: Algumas partes cansativas no auge da jornada de Pi, mais aborrecidas.

5/5 - Excelente!

09/01/2013

Estante à Quarta (28)

(imagem daqui)

08/01/2013

Feed

Autora: Mira Grant
Nº de páginas: 571
Editora: Orbit
ISBN: 0316081051

Sinopse: The year was 2014. We had cured cancer. We had beaten the common cold. But in doing so we created something new, something terrible that no one could stop. The infection spread, virus blocks taking over bodies and minds with one, unstoppable command: FEED. Now, twenty years after the Rising, bloggers Georgia and Shaun Mason are on the trail of the biggest story of their lives - the dark conspiracy behind the infected. The truth will get out, even if it kills them.


Opinião: Este é um livro de zombies que quase não é sobre zombies. Numa altura em que os mortos vivos são uma das tendências literárias do momento, tenho tido a sorte de todos os "livros de zombies" que li (não foram muitos, é verdade) não terem sido apenas mais do mesmo. Mas de todos, este foi o melhor.


A história passa-se num futuro décadas depois do fatal ano de 2014. Nesse ano, duas descobertas científicas há muito procuradas foram atingidas: a cura definitiva da gripe e a cura do cancro. Algures no meio de interacções biológicas e propagação a nível mundial, os vírus Kellis e Amberlee usados nas insvestigações científicas terão sofrido a uma mutação que só foi levada a sério quando os mortos começaram a não permanecer mortos. 

Em 2039 as pessoas vivem, ao contrário da maioria dos cenários de histórias de zombies, num mundo tecnológico e digital. Interacções físicas em locais públicos e privados são pouco comuns e foram desenvolvidas técnicas e protocolos rigorosos de controlo da população e do estado físico dos cidadãos. Uma luz vermelha no teste de sangue requerido para entrar (ou sair) do supermercado ou restaurante da esquina pode desencadear em minutos uma operação de limpeza do foco de infecção por parte das autoridades. Numa sociedade com medo de sair de casa, a internet ganhou suprema importância, nomeadamente a comunidade blogger, que é a principal fonte noticiosa: Alcance global em tempo real, live feed.

O After The End Times é um site noticioso cujos bloggers Georgia, Shaun e Buffy foram seleccionados para cobrir a excitante campanha de um candidato à presidência dos Estados Unidos da América. Cada um deles tem um blog pessoal cujas entradas no início de cada capítulo do livro são um dos pontos altos. 

E assim, no meio da história de zombies, repleta de tecnologia e ciência realisticamente avançadas, dispositivos de segurança e protocolos de sobrevivência, começa a verdadeira história: intrigas, traição, conspirações presidenciais à escala nacional, morte (normalmente seguida de uma segunda e mais definitiva morte) e seres humanos a tentar sobreviver. 

Este livro foi uma completa surpresa. Não esperava um worldbuilding tão detalhado (às vezes até repetitivo nas descrições dos processos de segurança anti-vírus), realista e original. Apesar do símbolo de Feed na capa do livro, sempre associei o título apenas ao verbo inglês alimentar numa perspectiva de "alimento para zombie". A vertente blogger da história foi assim uma vertente totalmente inesperada que adorei. Gostei particularmente do conceito científico em redor do vírus que origina os zombies, dos efeitos fisiológicos no corpo humano e das suas particularidades além da morte do indivíduo, mas não do corpo. O livro tem algumas partes da acção mais lentas, e acho que demora um pouco a "arrancar", mas ainda assim cativou-me imenso. 

O enredo geral de conspiração é um pouco cliché, bem como as personalidades das personagens principais, apesar de ainda assim me ter emocionado no final. Quer uma coisa quer outra mereciam um vilão melhor. Tendo em conta o final deste primeiro volume, fiquei muito curiosa em relação à continuação da série. 


O melhor: O worldbuiling.

O pior: O vilão básico.


4/5 - Gostei bastante

06/01/2013

Book Bingo

A ideia inicial foi da WhiteLady em 2012 e uma série de gente decidiu aderir. Este ano, tal como referi no post anterior, também eu me vou juntar a este jogo do Book Bingo. As regras são as conhecidas de qualquer jogo de bingo: fazer 5 em linha (vertical, horizontal ou diagonal) com as casas, e eventualmente completar o cartão todo. Apenas contam livros iniciados e terminados em 2013, e cada livro apenas pode ser submetido num categoria, mesmo que se enquadre em várias. A ideia pareceu-me divertida e já estou a pensar nos livros que poderei ler para categoria. 

Aqui está o meu cartão com as categorias que escolhi:

Como as categorias são este ano à escolha de cada participante, inclui algumas que me vão ajudar a atingir alguns objectivos que tenho em mente para este ano: 

- Ler mais BD (Novela Gráfica)
- Continuar a ouvir audio-books (audio-book)
- Ler Saramago (Autor Nobel)
- Ler em espanhol (livro noutra língua)
- Voltar a autores favoritos (Autor Novo - Livro Velho, Releitura)
- E atacar no geral alguns livros que tenho na minha lista para ler (Clássico, Distopia, Fantasia, YA, Ficção Histórica, Autor Lusófono...)

Vou acompanhar a evolução do Book Bingo no grupo do Goodreads, e além disso vou manter o cartão actualizado aqui no blog

Let the games begin!

04/01/2013

2012 vs 2013


Numa altura em que se multiplicam na net os balanços do ano que passou e as resoluções para 2013, pode parecer um pouco estranho vir falar de resoluções de ano novo num blog que esteve quase um ano parado. 

A verdade é que, como é óbvio, a vida de um blog se rege pela vida da(s) pessoas(s) por trás dele, e a revolução (quase literal) que teve lugar na minha vida pessoal, começando depois do meio de 2011, deixou muito pouco espaço para leituras, a net em geral, e o blog, por arrasto. Faltou tempo e disponibilidade, mas sobretudo faltou vontade. 

Em vez de fazer um balanço tradicional do ano que passou, prefiro fazer uma comparação global e estabelecer perspectivas, uma espécie de one-on-one destes dois anos rivais, um 2012 vs 2013. Ora vejamos... Ready, set, go!

No início de 2012 dei por falhado um compromisso literário e fechei o desafio do Goodreads de 2011 sem o ter completado.Quiçá devido a praticamente não ter lido na segunda metade do ano anterior, e sem grande entusiasmo para reverter essa situação. No início de 2013 estabeleci o desafio deste ano para um nível superior ao que consegui completar em 2012. Talvez seja uma meta ambiciosa, mas só demonstra como estou cheia de vontade de ler coisas. A vontade é realista, a concretização logo se vê.

Em 2012 li 32 livros. Em 2013 tenciono ler 40.

Desses 32, 5 foram graphic novels. Em 2012 por esta altura não tinha quase nenhum registo de graphic novels nas minhas estantes. Por esta altura tenho uma lista crescente de volumes interessantes para ler/adquirir. 

Durante 2012 procurei deliberadamente livros mais curtos, e em resultado, li menos páginas do que no ano anterior. Já em 2013 já volto a sentir a minha velha e fatal atracção por calhamaços. 

Em Janeiro de 2012 estava a preparar-me para mudar de emprego, cidade e país, e comecei a perder a minha assiduidade na net. No início de 2013 estou instalada e finalmente a normalizar rotinas e hábitos antigos. 

Durante 2012 publiquei apenas duas opiniões. Escrevi outras 11, mas por algum motivo não senti vontade de publicar. Algumas vão ser publicadas em 2013. 

No ano passado por esta altura os novos modelos Kindle da Amazon ainda eram novidade, e eu andava há meses a choramingar que queria um kindle, um qualquer! Umas semanas depois chorava, desta vez a sério, ao abrir a embalagem da Amazon mais valiosa de sempre. Não apenas pelo Kindle 4 que continha, pelos livros pessoalmente seleccionados e oferecidos, mas muito especialmente por vir a transbordar de carinho e amizade. Dizem que tanta amizade não cabe numa caixa da Amazon, mas graças a 40 pessoas fantásticas, espalhou-se pela internet, via Twitter, e por uma vez, enganou bem. Este ano por esta altura, 13 dos 32 livros que li foram no meu Kindle, mais 3 foram divididos entre formato digital e físico ao longo da leitura. 

No início de 2012, ainda não sabia, mas ia ouvir nesse ano 9 audiobooks. Até 2012 ouvia livros a passar a ferro e a caminhar, agora oiço também enquanto cozinho, faço bolos, ando de bicicleta por Barcelona e para abafar os ruidosos clientes do supermercado enquanto faço compras. 

No ano passado esperava ler livros em português e inglês, este ano ambiciono ler também em espanhol. 

Em Janeiro de 2012 fiz um top dos melhores do ano. Em Janeiro de 2013 chego à conclusão que ler menos pode ser bom, quando se fazem boas escolhas. Ainda assim, no meio de várias surpresas agradáveis e confirmações deliciosas, com dificuldade destaco, sem ordem especial, os 5 livros que mais me marcaram em 2012:




A Vida de Pi, Yann Martel
Pequena Abelha, Chris Cleave
The Help, Kathryn Stockett
Habibi, Craig Thompson
As Mentiras de Locke Lamora, Scott Lynch

Não consigo dizer quantos livros comprei até Janeiro de 2012. Desde aí até Janeiro de 2013 comprei apenas 7.

Em 2012 não tive qualquer expectativa ou motivação para este espaço. Em 2013, sem prometer para não ficar sem cumprir, vou deixar andar sem que se torne uma obrigação, e para que o que partilho seja o melhor.

Em 2012 este blog tinha um design, agora tem outro.

Para 2013 vou jogar ao Book Bingo da WhiteLady3 e Companhia, porque em 2012 não arrisquei desafio algum (o do GR não conta).

Há um ano estava a viver numa casa recheada com os meus mais de 400 livros, a grande maioria por ler. Hoje a minha nova biblioteca tem cerca de 30 livros, o triplo do que tinha em Março de 2012. 
A maioria ainda por ler. 

Entre 2012 e 2013 muita coisa mudou, mas há coisas que nunca mudam.